sábado, 5 de março de 2016

  
                  Telha de vidro ( RAQUEL DE QUEIROZ ) 



Quando a moça da cidade chegou

veio morar na fazenda,
na casa velha...
Tão velha!
Quem fez aquela casa foi o bisavô...
Deram-lhe para dormir a camarinha,
uma alcova sem luzes, tão escura!
mergulhada na tristura
de sua treva e de sua única portinha...


A moça não disse nada,
mas mandou buscar na cidade
uma telha de vidro...
Queria que ficasse iluminada
sua camarinha sem claridade...


Agora,
o quarto onde ela mora
é o quarto mais alegre da fazenda,
tão claro que, ao meio dia, aparece uma
renda de arabesco de sol nos ladrilhos
vermelhos,
que - coitados - tão velhos
só hoje é que conhecem a luz doa dia...
A luz branca e fria
também se mete às vezes pelo clarão
da telha milagrosa...
Ou alguma estrela audaciosa
careteia
no espelho onde a moça se penteia.


Que linda camarinha! Era tão feia!
- Você me disse um dia
que sua vida era toda escuridão
cinzenta,
fria,
sem um luar, sem um clarão...
Por que você na experimenta?
A moça foi tão vem sucedida...
Ponha uma telha de vidro em sua vida!


Disponível:http://100anosderacheldequeiros.blogspot.com.br/p/poemas-e-frases.html Acesso:05.03.16

Diversidades em Tempo de Seca


Quando Chico Bento, depois daquela noite passada ali, no abandono da estrada, chamou a mulher e, ajudando a levantar um dos meninos, foi andando em procura do povoado, em vão buscou, pelas voltas do caminho, sentando nalguma pedra, o vulto de Pedro.
Na estrada limpa e seca só se via um homem com uma trouxinha no cacete, e mais à frente, dentro de uma nuvem de poeira um cavaleiro galopando.
- Que besteira! Naturalmente ele já está no Acarape...
Mas chegaram ao Acarape, e debalde perguntaram pelo menino a todo o mundo. Não... Ninguém tinha visto... Sabia lá!... A toda hora estava passando retirante...
Numa bodega, onde o vaqueiro novamente fez indagações alguém lembrou:
- Homem, por que você não vai falar ao delegado? Ele é que pode dar jeito. Mora ali, naquela casa de alpendre.
No modo que agora era o seu, curvado, quase trôpego, Chico Bento endireitou para a casa apontada, que ficava meio apartada das outras, tendo de um lado um alpendre onde se viam algumas cangalhas de palha roída.
E bateu à porta, enquanto Cordulina se sentava no chão, na beirada do alpendre.
Lá de dentro, uma voz de mulher disse baixinho:
- Abre não, menina, é retirante... É melhor fingir que não ouve...
Chico Bento escutou; e sua voz lenta explicou, dolorida:
- Não vim pedir esmola, dona; eu careço é de ver o delegado daqui...
Um homem de cachimbo no queixo mostrou a cara na meia porta:
- Está falando com ele. O que é?
Chico Bento ficou um instante encarnando o homem, reconhecendo-o.
Mas o delegado, impaciente, repetiu a pergunta:
- O que é que você queria?
- Eu vim falar ao senhor mode um filho meu, que desde ontem tomou sumiço. Nós ficamos na estrada, eu assim, variando muito fraco... e ele veio vindo até aqui. Quando de manhã cacei o menino, não teve quem desse notícia.
É como é ele?
- Assim comprido, magrinho, a cara chupada... está dentro dos doze anos...
O delegado tirou o cachimbo da boca e, calcando com o dedo o tabaco, abanou a cabeça:
- Não tenho jeito que dar não, meu amigo... O menino, naturalmente, foi-se embora com alguém... Um rapazinho, assim sozinho, muita gente quer.
Cordulina ouvia confusamente o que diziam, e chorava, baixinho. Desanimado, Chico Bento sentou-se na mesma beirada de tijolo, junto à mulher.
Ainda na porta, o delegado entrou a fitar o caboclo com insistência, reconhecendo também aquela cara, o jeito de ombros, a fala.
E perguntou:
- Donde você é?
A voz cansada soou fracamente:
- Eu sou filho natural de Iguatu, mas faz muito tempo que morava pras bandas do Quixadá.
O homem procurou arejar a memória:
- Nas terras de Dona Maroca?
- Inhor sim, nas Aroeiras...
O delegado abriu a porta e saiu para o alpendre:
- Bem que eu estava conhecendo! É o meu compadre Chico Bento!
Chico Bento pôs-se em pé:
- Inhor sim... Eu também, assim que olhei pra vosmecê, disse logo comigo: este só pode ser o compadre Luís Bezerra... Mas pensei que não se lembrava mais de mim...
O delegado convidou:
- Entre, compadre! Essa é a comadre? Adeus, comadre, entre também! Cadê meu afilhado? Será esse que fugiu?
Cordulina entrava, puxando por um dos meninos, e respondeu:
- Inhor não... O seu afilhado era o Josias, morreu na viagem...
O homem chamou a mulher:
- Eh! Doninha! venha falar com uns conhecidos! Entre, compadre, ela está na cozinha. Vá entrando!
Depois, ficando só com Chico Bento, atentou na miséria esquelética e esfarrapada do retirante:
- Então, compadre, que foi isso? A velha largou você?
- Ela não quis tratar do gado mode a seca, e mandou abrir as porteiras... E eu fiquei sem ter o que fazer. A morrer de fome, antes andando...
O delegado quase deixou cair o cachimbo, num assombro:
- Não diga isso, compadre, não é possível! Deixar morrer aquele algodão todinho, sem mais pra quê!
- Pois mandou soltar no dia de São José! Eu ainda esperei obra duma semana...
O delegado se exaltou, gesticulando com o cachimbo:
- Aquela velha é uma desgraça! Tenho fé em Deus que o dinheiro que ela poupa ainda há de lhe servir pra comer em cima duma cama... Você não se lembra por que foi que eu saí das Aroeiras, compadre? Me convidou para abrir uma bodega, que me daria mundos e fundos, garantia de um tudo. Gastei o que tinha e o que não tinha em mercadoria, e o resultado foi aquele... Era obrigado a fornecer a ela pelo custo, tinha de fazer isso, fazer aquilo, e ela não me dava interesse de qualidade nenhuma. Um dia mandei tudo pro diabo, liquidei como pude o que possuía, e me larguei pra cá. Inda hoje não me arrependi... Mas você ficou, foi-se fiar nesse negócio de madrinha Maroca, teve o pago...
Chico Bento baixou a cabeça, concordando; olhou em redor, a casa caiada, a mesa envernizada, uma arca de couro, um relógio de parede:
- É, compadre, você está bem...
Lá de dentro a voz de Doninha chamou o marido:
- Luís, traz o compadre aqui, pra botar qualquer coisa no estômago!
Quando viu Chico Bento abancado, comendo, o delegado saiu da sala:
- Vou mandar dois cabras atrás de seu menino. Não mando praça, porque só tem lá na Redenção. Aqui no Acarape, só requisitando.
Do alpendre, mandou um moleque com um recado, e os dois cabras chegaram:
- Vocês vão ver se encontram um menino, filho de retirante, que atende por Pedro. Sumiu-se esta noite. Vejam lá se dão um jeito de achar. O pai anda em tempo de correr doido e é meu compadre!
Depois foi à cozinha, consolou Cordulina:
- Sossegue comadre, já mandei caçar seu filho. Se estiver por cima do chão, se acha...
Mas os cabras voltaram ao meio-dia sem o menino.
Um deles não conseguira apurar nada. O outro contou que o menino tinha sido visto na véspera de noite, num rancho de comboieiros de cachaça.
- Naturalmente tinha ido embora mais eles, de madrugada...
Cordulina já quase nem chorava.
Talvez fosse até para a felicidade do menino. Onde poderia estar em maior desgraça do que ficando com o pai?
Nesse mesmo dia, à tarde, tomaram o trem para a cidade.
Alma boa, o compadre Luís Bezerra! Tinha arranjado passagens, dera uma roupa sua ao Chico Bento, tinha feito a Doninha arranjar um vestido velho para Cordulina...
E agora, sentados, juntos, apertados, os três meninos que restavam muito agarrados a eles, abrindo os olhos de espanto à confusão de gente que se aglomerava no carro sujo, cuspido, fumacento - com as roupas brancas lavadas contrastando esquisitamente com a espessa sujeira dos corpos - Cordulina e o marido sentiram o trem apitar e sair correndo, e viram sumir a casa branca com o alpendre do lado, onde o compadre Luís Bezerra, em pé, de mãos nos bolsos, fumava o seu cachimbo.
No mesmo atordoamento chegaram à Estação do Matadouro.
E sem saber como, acharam-se empolgados pela onda que descia, e se viram levados através da praça de areia, e andaram por um calçamento pedregoso, e foram jogados a um curral de arame onde uma infinidade de gente se mexia, falando, gritando, acendendo fogo.
Só aos poucos se repuseram e se foram orientando.
Cordulina acomodou-se como pôde, ao lado do cajueiro onde tinham parado.
Da banda de lá, um velho deitado no chão roncava, e uma mulher de saia e camisa remexia as brasas debaixo de uma panela de barro.
Cordulina foi à sua trouxa, e tirou de dentro um resto de farinha e um quarto de rapadura, última lembrança da comadre Doninha.
Deitado na areia, calçado com um pano, já o Duquinha dormia. Os outros dois metiam a mão na farinha engolindo punhados.
Chico Bento olhava a multidão que formigava ao seu redor.
Na escuridão da noite que se fechava, só se viam vultos confusos ou alguma cara vermelha e reluzente, junto a um fogo.
Tudo aquilo palpitava de vida, e falava, e zunia em gritos agudos de menino, e estralejava em gargalhadas e em gemidos, e até em cantigas.
E estendendo a vista até muito longe, até aos limites do Campo de Concentração, onde os fogos luziam mais espalhados, o vaqueiro sacudiu na boca uma mancheia de farinha que lhe oferecia a mulher e, procurando quebrar entre os dedos um canto de rapadura, murmurou de certo modo consolado:
- Posso muito bem morrer aqui; mas pelo menos não morro sozinho...
(Trecho de "O quinze" - 1930)
Disponível:http://www.vidaempoesia.com.br/racheldequeiroz.htm Acesso:05.03.16.

O Quinze-Rachel de Queiroz

Rachel de Queiroz estreou na literatura brasileira com a publicação do livro O Quinze, seu primeiro romance, em 1930. Foi a primeira mulher a fazer parte da Academia Brasileira de Letras. A obra, pouco tempo depois de ser publicada, foi alvo de críticas dos intelectuais e autoridades da época, visto que abordava a grande seca que ocorreu no nordeste brasileiro no ano de 1915.
          Dividida em dois planos a narração prende o leitor do começo ao fim. Rachel procurou sensibilizar o leitor descrevendo de forma crítica e, ao mesmo tempo, emocionante a triste realidade do povo nordestino que, assolado pela seca e a miséria social, é forçado a migrar da sua região de origem em busca de melhores condições de vida nos grandes centros urbanos.
          No primeiro plano se destaca o amor impossível entre Conceição e Vicente. Ambos são completamente diferentes um do outro, tanto em nível social como intelectual. Conceição é uma jovem educada e inteligente que gosta de ler obras a respeito da emancipação feminina na sociedade e a luta inconstante pelos seus direitos e igualdade de gêneros. Já Vicente é um sertanejo rude, forte e obstinado que vive e se dedica à criação de animais, sobretudo bovina, na fazenda do Logradouro em Quixadá, atualmente uma cidade universitária e turística do Ceará.
          No segundo plano se destaca o sofrimento doloroso da família de Chico Bento que, forçada pela seca impiedosa e devastadora, é obrigada a migrar para a capital Fortaleza em busca de sobrevivência e, acima de tudo, de condições dignas para sobreviverem numa região castigada, de tempos em tempos, por longas e duradouras secas. Chico Bento, os filhos e a esposa Cordulina trabalhavam e viviam como moradores da velha Dona Maroca que mandou soltar o gado por conta do longo período de estiagem.  Sem emprego Chico Bento decide migrar para a capital, no entanto, não consegue comprar as passagens de trem e é obrigado pelas circunstâncias, juntamente com a família, a migrar a pé de Quixadá à Fortaleza. No percurso enfrentam muitas dificuldades, como a fome e a sede causadas pelos raios escaldantes do sol. O alimento que levavam - rapadura e farinha - logo se acaba e aumenta-se o sofrimento, principalmente para as frágeis e pequenas crianças. Chico Bento, em certo momento do caminho, encontra outro grupo de retirantes que esfolava um cadáver de uma vaca que havia morrido do mal dos chifres. Os retirantes há dias que não se alimentavam estavam resolutos em ingerirem a carne doentia do animal. Chico Bento, dolente com a situação e, ao mesmo tempo, constrangido e com asco, decide dividir o pouco alimento que restava com os novos amigos.
         Certo dia, esfaimado, Chico Bento encontra uma cabra no caminho e, sorrateiramente, a mata para saciar a fome da família moribunda. Entretanto, o dono do animal logo chega ao local e começa a descompor Chico Bento com palavras mesquinhas e pejorativas. Mesmo insistindo por um mísero pedaço de carne, para fazer um caldo à família esfomeada, o homem dá-lhe apenas as vísceras do animal já falecido. Sem água para limpar e sal para salgar as tripas, Cordulina apenas escorre as fezes com as mãos e assa as vísceras, insossa, no fogo improvisado. Em pouco tempo o mísero alimento é digerido por todos.
          Um dos filhos do casal, o Josias, morreu durante a caminhada enfadonha por ter comido uma raiz crua de mandioca. Cordulina ficou com o coração confrangido após a perda do filho. Outrora, Pedro, o filho mais velho do casal, sumiu-se durante a noite. Decerto havia fugido com outro grupo de retirantes. Mocinha, a cunhada de Chico Bento, decidiu morar e trabalhar para uma velha senhora chamada de Sinhá Eugênia. Todavia, não passou muito tempo convivendo com a velha rabugenta e saiu perambulando mundo a fora, de mão em mão, até engravidar.
           Conceição conseguiu convencer a sua avó, Inácia, a mudar-se para Fortaleza. A velha hesitou em ir, visto que há anos morava no Logradouro. Já em Fortaleza Conceição trabalhava como professora e ajudava, voluntariamente, no campo de concentração onde ficavam os flagelados da seca. A família de Vicente, por conta da seca terrível, se muda para Quixadá, porém ele continua resoluto trabalhando em prol dos animas descarnados e esqueléticos.
            Ao chegarem ao campo de concentração, em Fortaleza, Chico Bento e a família encontram Conceição que os ajuda a comprarem passagens com destino à São Paulo. Conceição sendo madrinha do filho mais novo do casal, o Duquinha, pede para criá-lo como filho. A princípio o casal hesita, mas depois são convencidos a entregá-lo à madrinha que desejava torná-lo “alguém na vida”.
           Já em dezembro as primeiras chuvas começam a cair trazendo consigo a alegria e a esperança de uma vida melhor ao povo nordestino. Dona Inácia volta para sua terra natal - o Logradouro -, já Conceição decide ficar em Fortaleza chateada com Vicente após ouvir boatos de que ele estava de namorico com Mariinha.


Sugestões:



Grandes escritores(as):Vida e obra
Rachel de Queiroz
Quinta ocupante da Cadeira 5, eleita em 4 de agosto de 1977, na sucessão de Cândido Motta Filho e recebida pelo Acadêmico Adonias Filho em 4 de novembro de 1977. Rachel de Queiroz nasceu em  Fortaleza (CE), em 17 de novembro de 1910, e faleceu no Rio de Janeiro (RJ) em 4 de novembro de 2003. Filha de Daniel de Queiroz e de Clotilde Franklin de Queiroz, descende, pelo lado materno, da estirpe dos Alencar, parente portanto do autor ilustre de O Guarani, e, pelo lado paterno, dos Queiroz, família de raízes profundamente lançadas no  Quixadá e Beberibe.Em 1917, veio para o Rio de Janeiro, em companhia dos pais que procuravam, nessa migração, fugir dos horrores da terrível seca de 1915, que mais tarde a romancista iria aproveitar como tema de O quinze, seu livro de estréia. No Rio, a família Queiroz pouco se demorou, viajando logo a seguir para Belém do Pará, onde residiu por dois anos.Em 1919, regressou a Fortaleza e, em 1921, matriculou-se no  Colégio da Imaculada Conceição, onde fez o curso normal, diplomando-se em 1925, aos 15 anos de idade.Estreou em 1927, com o pseudônimo de Rita de Queiroz, publicando trabalho no jornal O Ceará, de que se tornou afinal redatora efetiva. Em fins de 1930, publicou o romance O quinze, que teve inesperada e funda repercussão no Rio de em São Paulo. Com vinte anos apenas, projetava-se na vida literária do país, agitando a bandeira do romance de fundo social, profundamente realista na sua dramática exposição da luta secular de um povo contra a miséria e a seca. O livro, editado às expensas da autora, apareceu em modesta edição de mil exemplares, impresso no Estabelecimento Gráfico Urânia, de Fortaleza.  Recebeu crítica de  Augusto Frederico Schmidt, Graça Aranha, Agripino Grieco e Gastão Gruls. A consagração veio com o Prêmio da Fundação Graça Aranha. Em 1932, publicou um novo romance, intitulado João Miguel, e em 1937, retornou com Caminho de pedras. Dois anos depois, conquistou o prêmio da Sociedade Felipe de Oliveira, com o romance As três Marias. Em 1950, publicou em folhetins, na  revista O Cruzeiro, o romance  O galo de ouro. Cronista emérita, publicou mais de duas mil crônicas, cuja seleta propiciou a edição dos seguintes livros: A donzela e a moura torta; 100 Crônicas escolhidas; O brasileiro perplexo e O caçador de tatu. No Rio, onde reside desde 1939, colaborou no Diário de Notícias, em O Cruzeiro e em O Jornal. Tem duas peças de teatro, Lampião, escrita em 1953, e A Beata Maria do Egito, de 1958, laureada com o prêmio de teatro do Instituto Nacional do Livro, além de O padrezinho santo, peça que escreveu para a televisão, ainda inédita em livro. No campo da literatura infantil, escreveu o livro O menino mágico, a pedido de Lúcia Benedetti. O livro surgiu, entretanto, das histórias que inventava para os netos. Dentre as suas atividades, destaca-se também a de tradutora, com cerca de quarenta volumes já vertidos para o português. Foi membro do Conselho Federal de Cultura, desde a sua fundação, em 1967, até sua extinção, em 1989. Participou da 21ª Sessão da Assembléia Geral da ONU, em 1966, onde serviu como delegada do Brasil, trabalhando especialmente na Comissão dos  Direitos do Homem. Em 1988, iniciou sua colaboração semanal no jornal O Estado de S. Paulo  e no Diário de Pernambuco. Recebeu o Prêmio  Nacional de Literatura de Brasília para conjunto de obra em 1980; o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal do Ceará, em 1981; a Medalha Mascarenhas de Morais, em solenidade realizada no Clube Militar (1983); a Medalha Rio Branco, do Itamarati (1985); a Medalha do Mérito Militar no grau de Grande Comendador (1986); a Medalha da Inconfidência do Governo de Minas Gerais (1989); O Prêmio Luís de Camões (1993); o Prêmio Moinho Santista, na categoria de romance (1996); o  Diploma de Honra ao Mérito do Rotary Clube do Rio de Janeiro (1996);  o título de Doutor Honoris Causa, pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (2000). Em 2000, foi eleita para o elenco dos “20 Brasileiros empreendedores do Século XX”, em pesquisa realizada pela PPE (Personalidades Patrióticas Empreendedoras.

             Rachel de Queiroz - Documentário (entrevista)

   
Venha Ver o Pôr-do-Sol- Lygia Fagundes Telles

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Conto N.º 3: Venha ver o pôr-do-sol
Ricardo é um rapaz misterioso, cheio de ideias mórbidas. Achou de levar a namorada para ver o pôr-do-sol no cemitério. Lá chegando, Raquel estranhou a ideias, insultou-o de cretino, louco. Passearam por todo o local, visitaram alguns túmulos. Mas, para ver o pôr-do-sol teria que ser sobre o túmulo da família de Ricardo, pois lá estava sua prima.
"- Cemitério abandonado, meu anjo. Vivos e mortos, desertam todos. Nem os fantasmas sobraram, olha aí como as criancinhas brincam sem medo - acrescentou apontando as crianças na sua ciranda.
Ela tragou lentamente. Soprou a fumaça na cara do companheiro.
- Ricardo e suas ideias. E agora? Qual é o programa?
Brandamente ele a tomou pela cintura.
- Conheço bem tudo isso, minha gente está enterrada aí. Vamos entrar um instante e te mostrarei o pôr-do-sol mais lindo do mundo.
Ele encarou-o um instante. Vergou a cabeça para trás numa risada.
- Ver o pôr-do-sol!... Ah, meu Deus... Fabuloso!... Me implora um último encontro, me atormenta dias seguidos, me faz vir de longa para esta buraqueira, só mais uma vez, só mais uma vez! E para quê? Para ver o pôr-do-sol num cemitério..." (p.27)

"- Estou sem dinheiro, meu anjo, vê se entende.
- Mas eu pago.
- Com o dinheiro dele? Prefiro beber formicida. Escolhi esse passeio porque é de graça e muito descente, não pode haver um passeio mais descente, não concorda comigo? Até romântico.
Ela olhou em redor. Puxou o braço que ele apertava." (p.28)

"Ele esperou que ela chegasse quase a tocar o trinco da portinhola de ferro. Então deu uma volta à chave, arrancou-a da fechadura e saltou para trás.
- Ricardo, abre isto imediatamente! Vamos, imediatamente! - ordenou, torcendo o trinco. - Detesto este tipo de brincadeira, você sabe disso. Seu idiota! É no que dá seguir a cabeça de um idiota desses. Brincadeira estúpida!" (p.33)

"Ele já não sorria. Estava sério, os olhos diminuindo. Em redor deles, reapareceram as rugazinhas abertas em leque.
- Boa noite, Raquel.
- Chega, Ricardo! Você vai me pagar!... - gritou ela, estendo os braços por entre as grades, tentando agarrá-lo. - Cretinho! Me dá a chave desta porcaria, vamos!"

"E, de repente, o grito medonho, inumano:
- NÃO!
  Durante algum tempo ele ainda ouviu os gritos que se multiplicaram, semelhantes aos de um animal sendo estraçalhado. Depois, os uivos foram ficando mais remotos, abafados como se viessem das profundezas da terra. Assim que atingiu o portão do cemitério, ele lançou ao poente um olhar mortiço. Ficou atento. Nenhum ouvido humano escutaria agora qualquer chamado. Acendeu um cigarro e foi descendo a ladeira. Crianças ao longe brincavam de roda." (p.34)


Rádionovela - Venha Ver o Pôr - do - Sol (Lygia Fagundes Telles)


Sugestões: 

Capitães de Areia- Jorge Amado

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Capitães da Areia faz referência aos meninos de rua de Salvador, menores cuja vida desregrada e marginal é explicada, de uma forma geral, por tragédias familiares relacionadas à condição de miséria. O grupo de meninos que forma os Capitães se esconde em um armazém abandonado em uma das praias da capital baiana.  Os personagens que compõem o núcleo central da narrativa apresentam algumas particularidades: João Grande possui uma força bruta, o professor é lembrado pelo talento artístico, Sem-Pernas pela amargura existencial, a opressão sertaneja é representada por Volta-Seca, a sexualidade precoce por Gato, o malandro é o Boa-Vida e a tendência à religiosidade se manifesta em Pirulito. Todos são liderados por Pedro Bala, o protagonista do romance.  Órfão desde muito cedo, Bala descobre o passado de seu pai, um líder operário assassinado durante uma greve. Quem lhe dá a informação é João de Adão, organizador de greves que abre ao menino as portas da luta trabalhista. Bala prefere continuar a organizar os assaltos e roubos cometidos pelo bando, participando das ações mais perigosas. Um dia, junta-se ao bando a menina Dora, cujos pais tinham morrido em uma epidemia de malária. Vista inicialmente com desconfiança, aos poucos Dora se integra ao grupo, ganhando o respeito de todos e o amor de Pedro Bala. 
Durante uma ação, Bala e Dora são presos. Ela é colocada em um orfanato, enquanto o menino é submetido à violência de torturadores que tentam obter dele o local do esconderijo dos Capitães. Bala sofre, mas nada revela. Foge do reformatório e liberta Dora. A menina, no entanto, sai doente do lugar. Em sua última noite de vida, pede ao namorado que a possua.  A morte de Dora coincide com um momento de passagem para a vida adulta dos principais membros do bando. João Grande vira marinheiro, Volta-Seca se torna cangaceiro, Pirulito entra para uma ordem religiosa e Sem-Pernas se suicida para não cair nas mãos da polícia. Por fim, Pedro Bala abandona o grupo, mas não a condição de líder, agora voltada para a vida operária. Dessa forma, continua a obra inacabada do pai.




Sugestões:





Depois Daquela Viagem- Valéria Piassa Polizzi



Coragem e sua luta da autora, Valéria Polizzi, acabaram por torná-la um símbolo de sobrevivência para os portadores do temido vírus HIV. O livro é uma auto-biografia da autora, que aos 16 anos contraiu o vírus. Lançou-o em 1999, quando estava com 23 anos, após a insistência dos amigos que pediam para que ela contasse sua história, seus sofrimentos, mas também suas vitórias.
Em forma de diário, em tom coloquial próprio dos jovens, Valéria relata com bom humor e descontração as suas vivências com os amigos, os namoros, o despertar da sexualidade, a angústia diante dos exames e muitas outras coisas que atormentam qualquer adolescente.
O livro é o testemunho vivaz de uma adolescente com sólida formação educacional e familiar que por um desses descuidos cuja razão jamais se alcançará completamente, mantém uma relação sexual sem a utilização do preservativo.
Na obra, ela mostra como, de repente, por causa da quatro letrinhas, sua vida passou por uma reavaliação radical. Ela expõe, sem meias palavras, como a doença mexeu com sua cabeça e com seus sentimentos.
Depois daquela viagem é um livro triste e alegre, tocante e verdadeiro, um testemunho da coragem e da determinação de levar adiante a vida, apesar da AIDS.
Como numa conversa entre amigos, o leitor tem a oportunidade de partilhar com Valéria a angústia de compreender que ela está com AIDS, um dos males mais comentados a partir da década passada. Ao mesmo tempo, Depois daquela viagem propicia uma verdadeira imersão cultural no cotidiano e na alma dos jovens de sua época.
Palavras da autora: "Pensar e escrever o livro foi um processo de três anos, no qual cresci muito. Em primeiro lugar, tive de trabalhar muitas questões dentro de mim, para depois colocá-las no papel. O intuito era mostrar que as pessoas podem viver com o HIV, para ajudar outros soropositivos como eu. E também mostrar que a AIDS pode acontecer com qualquer um".O livro começa no ano de 1986 onde todos acreditavam que o vírus da AIDS só infectava homossexuais, que havia pouca informação de como evitar a infecção e também havia um grande preconceito com quem era infectado pela doença. Na época não havia remédio para evitar que os sintomas aumentassem. Só a partir de 1990 é que descobriram como diminuir os sintomas. O livro termina em 1994 com a doença no mundo aumentando cada vez mais.
"A vida é uma daquelas coisas tão presentes que passa despercebida. Às vezes nós precisamos quase perdê-la, ou achar que está por se perder, para lhe darmos o devido valor e dimensão. E, ainda assim, não conseguimos entendê-la direito", reflete Valéria.
Resumo
Valéria Piassa Polizzi era uma jovem como todas as outras. Aos 16 anos de idade, namorava um rapaz bem mais velho, de 25 anos. Namoro conturbado, ciumento, violento. E quente. Desinformada sobre os perigos das doenças sexualmente transmissíveis, aceitou quando o namorado quis transar sem camisinha, afinal, "ela não era puta" e só com puta é que era preciso usar preservativo. Dois anos depois do fim desse namoro, Valéria descobriu que era portadora do vírus da AIDS.
A autora ainda relata seu sofrimento e o dos pais quando tiveram os resultados dos exames, o medo de encarar as pessoas e todo o tempo que passou sem contar ao restante da família e aos amigos que tinha a doença.
Conviveu durante uns dois anos com os amigos sem lhes contar nada, morrendo de medo de que alguém descobrisse tudo, de que tivessem contato com seu sangue e também contraíssem a doença, com medo de ter um namoro mais sério. Ela termina o Ensino Médio, começa uma faculdade mas acaba desistindo do curso.
Após isso, Valéria viajou para os Estados Unidos para fazer um curso de teatro, aprendeu a viver sozinha, fez novos amigos mas continuava com medo de contar para os outros que tinha HIV. Ela começou a ter alguns problemas de saúde, e ao procurar um médico, descobriu que existiam novos tratamentos e que a AIDS poderia ser controlada com medicação. No início, ela resistiu ao tratamento, pois estava esperando apenas sua morte chegar. Mas graças ao médico americano, que lhe incentivava, colocando-a em contato com outras pessoas que possuíam a doença e viviam normalmente, ela resolveu utilizar os remédios.
Ao voltar ao Brasil, sua saúde piorou, ela passou alguns dias internada no hospital e só nesse momento conseguiu contar para os amigos e familiares que tinha AIDS. Recebeu o apoio de todos e percebeu que poderia e deveria levar adiante sua vida, sem o medo de morrer a qualquer momento, como ela tinha antes.


           Depois daquela viagem, de Valéria Polizzi